Assim como a elaboração de um Quilt (colcha de retalhos), nosso NOVÍSSIMO! curso (que emoção!) pretende articular as principais questões que envolvem a relação entre as mulheres e a produção têxtil a partir de suas histórias pessoais e coletivas tomando como base uma perspectiva feminista da história da arte. Desde artistas anônimas e suas "artes de armário", conceito que trabalharemos na primeira aula, até produções conscientemente subversivas que atuam na revitalização da história de mulheres do passado e suas técnicas ancestrais. Ferren Gipson em "Women's Work: From Feminine Arts to Feminist Art" considera a construção de seu livro tal como a de um Quilt e assim também consideramos este curso. Para ela,
"no quilting, os blocos são unidades individuais costuradas para formar um desenho mais amplo – eles podem ser sólidos ou formados por diferentes cores e materiais. Dentro desta colcha de trabalhos de mulheres, cada artista tem seu próprio bloco (ou capítulo) onde poderá descobrir como a sua prática contribuiu para a história da arte têxtil e cerâmica nos séculos XX e XXI."
Partiremos de duas discussões que, apesar de parecerem ter sido superadas, ainda geram muitas controvérsias. Primeiro sobre a relação entre arte têxtil e "hobby art". Muitas mulheres artistas ao longo de suas vidas mantinham dois tipos de produções: uma para ser exibida de acordo com o gosto, mercado e questões morais (do que uma mulher poderia produzir ou não por ser mulher) e outra que a Lucy Lippard chama de "arte de armário", "passatempo", "hobby art", ou seja, aquela que a artista faz para si em sua intimidade, longe do olhar alheio e sem intenções expositivas. Ao mesmo tempo por saber que não seria "bem aceito" e porque ela mesma julga como uma produção "fraca" e "inferior". Um dos principais pontos abordados pelas teóricas e artistas feministas foi repensar a classificação hierárquica entre arte e artesanato. Essa reflexão surge junto ao processo de revitalização por artistas feministas das práticas tradicionalmente relacionadas às mulheres, como o bordado, a costura, o crochê etc. Nesse sentido, se propõe um novo pensamento do que é “arte” e muitas artistas passam a utilizar essas técnicas em suas obras.
E segundo sobre a relação entre arte e feminilidade que, de algum modo, se entrelaça ao primeiro ponto, uma vez que muitas das mulheres que produziam arte têxtil encontravam-se associadas ao espaço doméstico (outras utilizavam como forma de sustento e independência, como veremos) e a prática indicava habilidades manuais consideradas inferiores e supostamente adequadas ao temperamento de uma mulher. Na História da Arte hegemônica as mulheres foram sempre relacionadas a produções consideradas "inferiores" dentro da hierarquia de gêneros pictóricos. Embora, o entendimento da produção têxtil como "arte" tenha levado séculos, algumas pinturas à óleo feitas por mulheres ganharam muito mais o sentido "decorativo" do que propriamente de "grande arte".
A produção têxtil sempre esteve presente em processos individuais ou coletivos de mulheres. Os primeiros grupos de mulheres foram formados através de encontros que geravam a elaboração de obras têxteis em diversas culturas. As produções que iremos abordar abrangem desde tradições milenares de anônimas até artistas e coletivos contemporâneos que enxergam a potência política em resgatar essas práticas.
Esse curso também é para quem é artista e, principalmente, para mulheres que ainda encontram dificuldade de se entenderem como artistas. Você já deixou de mostrar algum trabalho seu por considerar que poderia ser mal interpretado ou que era irrelevante? Quantas mulheres destruíram ou tiveram trabalhos destruídos por terem sido considerados menores e inferiores? O que determina o que deve e o que não deve ser preservado como arte?
De 10 a 31 de janeiro de 2024 ~ Quartas de 19 às 20:30 pelo Zoom
(as aulas ao vivo serão gravadas e disponibilizadas por 2 semanas para quem se inscrever na "modalidade gravada")
Imagens utilizadas neste post de cima para baixo: Cecilia Vicuña, Disappeared Quipu; Fotografia de Arthur Rothstein, Sewing a quilt. Gees Bend, Alabama; Tuesday Smillie, Together.